Novembro 2001
Que balanço faz desta primeira visita a Portugal?
Tinha três objectivos. A promoção dos direitos humanos, a promoção da harmonia religiosa e, em terceiro lugar, é minha responsabilidade e dever, como tibetano, falar do Tibete. Fiquei muito satisfeito com os encontros com o público. Na terça-feira de manhã estive em Fátima. Já visitei vários lugares sagrados de diferentes religiões, sempre como peregrino. Estive em Jerusalém duas vezes e em Lourdes, em França. Agora fui a Fátima. A imagem de Maria é tão bonita, é comovente. Não reparei logo. Estava já a afastar-me quando olhei para trás. Subitamente algo extraordinário me chamou a atenção. Foi assim. [Solta uma risada].
Está desapontado por não ter podido discutir a questão tibetana com o governo português?
Não. Portugal é membro da União Europeia. Como um todo, a UE apoia a causa tibetana. A minha visita a Portugal não é oficial, mas cultural e espiritual.
Neste momento o mundo não é um sítio particularmente pacífico. Como é possível tornar o mundo melhor?
[Ri-se]. Quando falamos de violência ou de paz temos que ter uma perspectiva global. É muito claro que há um anseio forte e um desejo sério de paz na mente das pessoas, sobretudo dos jovens. No século XX, nas I e II Guerras Mundiais, os cidadãos juntaram-se massivamente aos esforços de guerra com um grande entusiasmo. Este estado de espírito, claramente, já não existe no mundo. Mesmo num país comunista, como a China, não existe esse estado de espírito. Esta é uma grande mudança. A não-violência está a crescer por todo o lado. É claro que é muito triste haver guerra no Afeganistão. Mas a forma como estão a ser conduzidas as acções militares é única. Por um lado estão a utilizar-se bombas, mas por outro existe uma extrema precaução para não causar baixas civis. Nas outras guerras, na I, na II, no Vietname, na Coreia, não foi assim. A atitude mudou. Isso é positivo.
Não seria melhor não bombardear sequer o Afeganistão?
Logo a seguir aos ataques terroristas de 11 de Setembro, escrevi uma carta ao presidente Bush, onde expressava a minha solidariedade e tristeza, mencionando que é absolutamente justo e correcto pôr termo ao terrorismo, mas de forma não-violenta. As coisas não correram assim, infelizmente. No período inicial da guerra, eu estava em Estrasburgo e aí expressei a ideia de que os métodos violentos são sempre imprevisíveis. Uma vez iniciada a violência, as coisas podem facilmente ficar fora de controlo. Hoje, a situação no Afeganistão parece-me algo positiva, sobretudo depois de ter visto muitos afegãos saudar a derrota dos talibãs. Portanto, há alguma justificação, mas, ainda assim, a violência é triste, causa sofrimento.
O que pode o mundo fazer pela causa tibetana?
A solidariedade para com o Tibete está a aumentar em todo o mundo. A longo prazo, a preocupação da comunidade internacional e o impacto da opinião pública exterior ao Tibete produzirão, possivelmente, resultado. Mas no imediato, a China mostrar-se-á mais agressiva. [Ri-se].
Acredita que haverá possibilidade de diálogo com a China?
Ainda recentemente as autoridades chinesas lamentaram que tivesse utilizado a palavra "ocupado", referindo-se ao Tibete.Estou completamente empenhado, não na independência, mas numa autonomia genuína. Na nossa perspectiva, o Tibete é uma nação separada da China. Por isso, uso a palavra ocupação. Os nossos amigos também. A América e a União Europeia, todos consideram que o Tibete é uma terra ocupada.
Afirmou que viveria para ver o Tibete livre. Como pensa que isso vai acontecer?
A compaixão e a não-violência bastarão?A China é uma grande nação em processo de mudança. O comunismo já não é a ideologia do Estado, que está muito mais orientado para a economia de mercado, mas o sistema totalitário mantém-se sem a ideologia comunista. É uma situação peculiar. Mas a China, mais cedo ou mais tarde, terá que acompanhar a tendência global dos direitos humanos, da democracia, da liberdade de informação. A pergunta é: quando? Cinco, 10, 20 anos? Ninguém pode dizê-lo. Supondo que são 20 anos. Terei 86 anos. Ainda é possível ver o Tibete livre [ri-se]. Dentro da própria China há hoje chineses budistas e intelectuais críticos da política do seu governo, e têm-nos transmitido a sua solidariedade. O Tibete e a China terão que encontrar-se a meio caminho e a comunidade internacional pode ajudar nesse processo.
quarta-feira, setembro 22, 2004
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